19/06/2008



não é motivo para te odiar
não, não te odeio
é só este deixar de gostar
que se instala no peito
depois de tanto esperar
promessas no leito
de lábios solitários
que ficaram por usar

não é motivo para te odiar
não, não te odeio
é só este deixar de te amar
que se instala no peito
por tanto esperar
por tanto lutar e quebrar
que me leva a desistir de ti
por só me saberes ignorar


noite em vão
à tua procura
já não tenho tempo
já não tenho alento
nesta inútil espera
que não sossegas
com esse desaparecimento
entre efémeras aparições
promessas incumpridas
para estas ambições
para estas ilusões
pensar que as constelações
me iriam favorecer
e contigo derreter

16/06/2008



vai mal o planeta
vive-se em incerteza
sobe o preço do petróleo
desce o preço da fome.
protestos, bloqueios
e contestação.
mal-estar instalado
a suspirar revolução.
hoje morreu um homem
amanhã mais morrerão.
irá haver clareza,
irá haver razão útil
para dar futuro
a uma nova geração
sem que fique
incólume e fútil
sem que fique
triste e presa?

vai mal o planeta
democracia, globalização
transformada em treta
do monstro papão
e dos aprendizes de letra
chulos da governação
a passear pela mão
a comitiva da cartelização
que deixam com mais fome
o meu irmão de áfrica
da ásia e do islão.
vive-se sem humanidade
vive-se sem socialização
sobe o preço do petróleo
desce o preço da vida
nesta falta de pão.
e tu quanto mais tempo
vais ficar parado
colado ao espelho
de comando na mão?

democracia: uma treta!
globalização: uma treta!
sobe o preço do petróleo,
sobe o preço do pão!

democracia: uma treta!
globalização: uma treta!
sobe o preço do petróleo,
desce o preço da fome!

e tu quanto mais tempo
vais ficar parado
colado ao espelho
de comando na mão?


ontem trouxe vídeos para ti
não apareceste mas eu não desisti.
hoje trouxe-te outra oferta
deixei instalações de cor,
desenhos em cartão pelas paredes
nas ruas do quarteirão,
mas não apareceste e perdi,
perdi vontade de lutar
e de não desistir de ti.
e agora que me deito
perco vontade de acordar
de levantar, lutar e perder,
todos os dias perder
até já não conseguir mais
encontrar-me a mim.
este insistir, este partir
constantemente do zero
e correr sem te alcançar
cansa-me, leva-me à exaustão,
consome-me a esperança,
todo o sentido e a razão.

09/06/2008

From DrawingsAndPa...

hoje vim sentar-me
no jardim do bairro
tocar guitarra e relaxar
porque esta madrugada
vi-te passar a
pernoitares os olhos em mim
e andei contigo
todo o dia a sonhar
e se estivesses aqui
de olhos nos meus
era assim que gostaria
de to dizer, de to cantar
neste eterno ver-te passar
neste eterno não te tocar
neste eterno contigo sonhar
neste eterno ver-te desfilar
sem poder ambicionar
sem poder sentir-te
que mantém a magia
que tens no olhar
que carrega um ar
de bonequinha princesa
passeando em dor
uma extrema beleza
sob caracóis em flor
negros, largos e longos
numa madrugada de junho
de serralves em festa
e vejo-te passar
e viste-me passar
e pernoitaste o olhar
um segundo a mais
do que este sentir
consegue suportar.
este eterno ver-te passar
ver-te desfilar
sem poder ambicionar
sentir-te, tocar-te
só deixar-te ficar
entrelaçada em mim
em beijos dados
e corpos amados
nestes sonhos
há demasiado sonhados
neste eterno
ver-te passar
sem poder sentir-te
sem poder tocar-te
só deixar-me ficar
a poder sonhar-te

05/06/2008



apetece-me gritar
por não ter nascido aqui
por não estar habituado
a essas regras de etiqueta
tantas vezes leis de sarjeta
e não te saber conquistar.
apetece fugir
para longe daqui
num sítio onde possa
desabafar e ganir
chorar e curar
esta estranha dor
de não te ter aqui.


e cada noite
é mais do mesmo
no conforto dos amigos
na reunião de café
para socializar
para marcar com presença
uma cadeira, um lugar
para consolidar este integrar
ganho a pulso
que não parece cicatrizar
por não ter nascido assim
nunca haverá mutação
sempre pronto a quebrar
esta frágil ligação


e todos os dias
me aproximo de ti
é esta traça
esta doce dor
de te ter aqui
em lençois em rubor
até ser amor
até ser amor

e todos os dias
me mostro a ti
é esta vontade
queres-te para mim
inteligente, doce
e coração de rubi
até ser amor
até ser amor

e todos os dias
me dou a ti
e todos os dias
foges assim
de sorriso nos lábios
em sonhos sem fim
até ser amor
até ser amor


estupidez extrema
pensar que és pior
por teres no sangue
a correr a mesma cor
e à superfície a pele
a colorir outro suor

estupidez extrema
pensar que não tens dor
por teres na boca
a mesma saliva
a entoar palavras
com outro sabor

estupidez extrema
pensar que não podes chorar
por teres o mesmo sal
o mesmo brilhar
com olhos afiados
de outro lugar

estupidez extrema
que afunda o planeta
e deixa o irmão
de mesmo sangue
de mesma dor e olhar
de peito a latejar

03/06/2008


não te vejo desde fevereiro
e agora que junho
me rouba de mim,
rouba-me os dias o pensamento
e deixa-me a sonhar
acordado todo o tempo
só a sonhar contigo
só a pensar em ti
e vejo-me a salvar-te do fogo
e a sacrificar esta minha
mísera existência
para salvar a tua
como derradeira forma
de te mostrar
quanto gosto de ti.
e só depois de me veres
salvar-te das chamas
e ver-me perecer
te darias conta que poderias
ter gostado de mim.
e acordo de estar acordado
e sinto-me enlouquecer
por em tantos meses
não me dares uma hipótese
de poder saber de ti.
e sinto-me enlouquecer
sempre que entro no café
e ter que ver a tela
que pintei para ti
a envelhecer a parede
numa infrutífera espera.
e sinto-me enlouquecer
a envelhecer com a tela
num esquecido café
numa inútil espera.
e sinto-me enlouquecer
por finalmente perceber
que no céu quase vazio
eras a única estrela
e agora que o céu negro
que de tão oco murchou
perdi a noção de cor
e já não o sei pintalgar
com outros brilhantes
que me dêem paixão.
e sinto-me enlouquecer,
a envelhecer
por já nem saber
o que é isso de paixão
e a que saberá.
sinto-me enlouquecer,
a envelhecer
por não te esquecer,
seguir em frente e viver.

dou-me conta em noites vazias
que atirei fora pela janela,
pela porta, pelos pulmões,
pelos colhões, pelos corações,
pelas sensações, pelas desilusões
trinta anos de vida.
esqueci e traí amigos,
esqueci e traí amores,
troquei-os por novos,
troquei-as pelo celibato.
e o relato vai-se acumulando
desfiando-se o novelo
num amontoado de tinta
vindo da caneta companheira
que ao longo dos meses
se foi afeiçoando a mim
e só agora quase de bico desfeito
se apaixona e deixa amar
como dois velhos num banco de jardim
à espera do fim.

mil e trezentos quilómetros
e o vazio não se extinguiu.
parece que nem saí daqui
e o doce lar há muito
que já perdeu o açúcar,
o sal e o sabor.
tornou-se em algo
completamente inerte
e calmamente indolor
e no fim de contas
talvez seja essa calma
que lhe dá valor.
talvez seja essa calma
o puro toque de sabor.

corro atrás de ti
em sonhos tardios
e acabo sempre preso
no mesmo lugar
pendurado num precipício
e de mãos a escorregar
não temendo olhar para baixo
nem me deixando voar.
corro atrás de ti
em becos vazios
e não desisto
e insisto
até me encontrar
a andar ás voltas
a correr, a saltar,
a bater em paredes frias
e camas vazias.

fio, fio, fio
desfio o momento
fujo em contra-mão
ás marcas do tempo
fio, fio, fio
desafio a ilusão
a enganar o corpo frágil
com um resto de loção
fio, fio, fio
rio da minha pele
e do absurdo de dias
que me leva a curar
as marcas do teu sorriso
acerca do meu olhar

afundo-me na inércia
para não ter que mudar
para que nada abale
a certeza de acordar
no ritmo do deixa andar
no viver duma vida fútil
a consumir o bem inútil
até me sentir despertar

e todos os dias me ouço:
vou mudar! vou mudar!
e todos os dias me esqueço
e deixo andar, deixo andar

a respirar a rotina
a surdina de trabalhar
para que nada abale
a ilusão de bem estar
que me amarra os sonhos
e me consome o tempo
até me sentir acordar
num oco desalento

e todos os dias me ouço:
vou mudar! vou mudar!
e todos os dias me esqueço
e deixo andar, deixo andar.

02/06/2008

Madrid, Bar Deseo, onde acaba o desejo começa o...

30/05/2008





vivo numa caixa cinzenta
tão igual a outras setenta
onde só o meu velho frigorífico
se manifesta,
e protesta

vivo numa gaiola cinzenta
tão igual a outras setenta
onde só o velho porteiro
diz bom dia
em agonia

ahhhhhhhhh
eu não quero mais
esta solidão urbana
que me mata
que me esgana

vivo numa caixa cinzenta
tão igual a outras setenta
onde só o meu velho frigorífico
se manifesta,
e protesta,
e protesta,
e protesta,
e protesta!

ahhhhhhhhh
eu não quero mais
esta solidão urbana
que me mata
que me esgana

19/03/2008


Dói-me não adormecer
dói-me ver amanhecer
encolhido no sofá
e a cama por desfazer.
dói-me o corpo, doi-me a cabeça
dói-me a falta que faz
um segundo de calma,
um segundo de paz.

dói-me o anelar da mão
de tão só que está
faz-me falta um coração
e a paixão que ele dá

Dói-me não adormecer
dói-me ver amanhecer
encolhido no sofá
e a cama por desfazer.
dói-me a boca mirrada
dói-me a face lilás
à procura da caixa negra
neste peito que se desfaz.

dói-me o anelar da mão
de tão só que está
faz-me falta um coração
e a paixão que ele dá

10/03/2008


chamam-te carcaça inútil
dinheiro fora de circulação
espécie humana anormal
habitante de banco de jardim
a jogar as cartas com os teus
e a roleta russa com o tempo
de olhar mais vago e distante
pressentindo algo mais próximo
algo bem mais perto de ti.
chamam-te carcaça improdutiva
substituída por uma máquina
brilhante, bem oleada e bem escrava
a troco do soldo mínimo.
os entendidos recusam a palavra
para chamarem a atenção
e sem esperança se desculparem
de a cura ser uma ilusão
para se desculparem de não conseguir
transformar a doença em benção.
chamam-te de carcaça inútil
após quarenta anos de trabalho
a alimentar os bancos e o estado
carregado de medicamentos
mas só metade dos que o dinheiro
consegue comprar
és atirado, despachado
para o ferro velho
para o lado de lá
não que a morte
te tenha vindo buscar
mas apenas pela sociedade
a quem deste vida
essa é a primeira a te empurrar.
chamam-te carcaça inútil
chamam-te de velho

03/03/2008


tudo está bem agora.
os cantos do quarto
alinham-se em silêncio
rodando na penumbra
e a cama gigante
em déjà vus sucessivos
só serviu de pátio
para o desalento
afastando os corpos
madrugada adentro
até restar só o meu
em déjà vus sucessivos
a tentar trazer o teu
corpo de curvas de fogo
e a tentar reanimar o teu
coração de pedra de volta
mas tudo está bem agora
no silêncio deste quarto