14/04/2006

assisto a esta lenta decomposição
enquanto olho de soslaio para dentro
deve ser água com sal que corre
dentro destes tubos.
dois deles estão rotos um pouco
abaixo das sobrancelhas.
deve ter sido da solidão urbana
que os corroeu aos poucos.
as nuvens de chumbo roçam-se
pelas arestas dos habitantes de betão
e vão vertendo pedaços de azulejos
minúsculos produzidos em série.
calcados pela indiferença de quem passa
à pressa de cabeça altiva e crista depenicada.
um destes dias um desses pequenos esquecidos
há-de reclamar atenção atingindo em queda
livre um inocente e romper-lhe os canos
um pouco abaixo das sobrancelhas.
a água salgada há-de então
verter-se toda, diluir-se na calçada
e abraçar os pequenos pedaços.

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